Senhoras. Senhores.
Bom dia/tarde/noite; sejam bem vindos. E olha
nós, onde cá estamos, mais uma vez, para tratar de assuntos – importantes? Sim,
importantes – do blog.
Hoje é dia de literatura brasileira e, como
não trabalhamos ainda nada do feminino, trazemos aqui, a nossa mais que humilde
esteira de discussões, o conto “Felicidade Clandestina”, de
Clarice Lispector, o primeiro conto contido no livro de mesmo título.
Da espécie livro que nos chegou às mãos só
temos o que agradecer: santa arrumação em nossa casa que nos fez descobrir essa
jóia literária e familiar. Sim; o texto encontrado foi impresso pela Editora
Vozes para a Editora Nova Fronteira S.A., em abril de 1989.
E sim; o livro encontrado encontra-se
assinado, no mês dez de 1990, por uma amiga pessoal de nossa mais que
queridíssima e saudosa irmã, Adriana Borges; hoje, moradora de nossos corações,
e bons pensamentos.
Beijos Niãna...
Passado o inevitável momento dos sentimentos,
breve comentário do conto...
Pense em duas meninas: Uma e Outra.
Pensou? Ok.
Vamos brincar aqui...
Era uma vez Uma e Outra.
Uma, é feia; Outra é bonita.
Mas Uma é filha de dono de livraria.
Lógico que Uma tem, e não quer dar, um livro,
que a Outra quer.
Não quer dar; mas não quer que a Outra
desista.
Trocando em miúdos: Uma quer pirraçar a Outra.
Até que um dia Uma é obrigada a dar o tal do
livro a Outra.
E Outra? É feliz com o livro? Não; a Outra é
feliz com o seu amante.
E fim de papo.
Chega!
Deixa a vida umas e outras...
Ou não... Rsrs...
Agora, as nossas – mais que humildes –
impressões...
Ao nos aventurarmos a fazer qualquer que seja
leitura de Clarice Lispector o que nos salta aos olhos é sempre a tal da
perturbação psicológica. Impressionante como é presente a dimensão mental de
cada personagem apresentado por essa ventríloqua. Não só os personagens, nós,
leitores também somos manipulados, levados na onda de fumaça.
E por falar em manipulação pense bem nessa
palavra ao longo desse conto. Pois é o que mais nos é trazido, na narrativa de
uma moça, que conhece outra sujeita; não tão bela, de enorme busto, e com os
bolsos cheios de balas.
Acontece que essa sujeita é filha de um dono
de livraria, e promete emprestar a personagem principal um livro que lhe é de
muito interesse. No dia do empréstimo; pena: esqueceu o compromisso com a amiga
e, sem-querer-querendo emprestou a alguém.
No outro dia? Outro problema, outro
esquecimento. E outro e outro e outro, e tome-lhe volta. Assim segue-se a
tortura chinesa, segundo a narradora. Aqui em Salvador, diríamos “baratino”...
Belo dia, durante a entrevista que se
findaria com mais uma injeção na testa, a mãe da dona do livro chegou; quis
saber o que havia para as sucessivas visitas. Sabido do assunto; pasmem: meu
Deus criei um monstro, pensou a mãe.
Bomba: o livro sempre estivera lá. Duas
descobertas conflitantes: a personagem principal; de que estava sendo feita de
trouxa; e pior: da mãe, de que tinha uma filha que operava em sadismo silencioso
a duzens-zi-vinte voltz, com bordas, para não falar requintes, de psicopatia.
Que beleza de ser humano hein? Sádica,
psicopata; perversa e indiferente.
E olhem que chupava doces o dia todo viu?
Magine se fosse chá de boldo...
Ela ia ser o satanás de toca...
Uma solução tinha de ser dada àquela situação
gravíssima, mas não se confundam, a mãe também não é santa: há que se
solucionar o caso. Não por compaixão da menina anônima plantada no portão, mas
sim a perversidade da filha. Descobrir que um filho seu age dessa maneira é
realmente revelador.
Batido martelo: estava obrigada a dar o
livro, e outra teria o direito de ficar com o dito cujo por quanto tempo
quisesse.
Ouviram?
Quanto tempo quisesse...
Era lindo...
E assim segue-se a vida da moça, feliz; como
gente no luxo; como pinto no lixo. Weba! Ela curte; ela brinca, ela esquece de
propósito para depois reencontrar o tal do livro; a felicidade consubstanciada
no objeto retirado da menina má.
Uma interessante alegria, notável estado de
êxtase; uma – como muito bem posto no título – literal felicidade clandestina.
Felicidade que catalisou, subiu, e elevou o objeto ao estado de pessoa.
Elevou-se a ponto de fazer a moça ver-se não
mais como uma menina com um livro: uma mulher com seu amante. Essa foi a outra
marca que Clarice nos deixou: a da subversão.
Em geral se flagra na sociedade, sempre,
fortes sintomas de deploração dos valores éticos e morais, o que chamamos de
coisificação das pessoas. Em Graciliano, por exemplo, isso é muito freqüente.
Graciliano só pa-variar.
É possível levantarmos a pergunta de que
Clarice fez aqui o processo inverso: que ela operou, então, a personificação da
coisa, no caso o livro, transformando-o em amante? Acho valido pensar assim...
Não precisa dizer que o embate entre as anônimas
– daí “Uma & Outra” – fica muito mais do que recomendado né?
Nota mais que dez...
Não tínhamos tido experiência de leitura com
Clarice; mas agora, parece que a coisa vai se dar de vento em polpa. E que
venha, daí, uma amizade sincera. É o nome do conto seguinte,
rsrsrs...
Se formos fazer uma análise mais que
simplista do que se pode ser entendido até como um conto infantil dessa
escritora de mega-calibre, veremos que quem sabe, sabe; que quem é grande é
grande; e faz coisas grandes, mesmo que o fato seja uma besteirinha, como uma
broma de meninas adolescentes; mesmo que seja o embate entre uma que quer,
outra que não quer dar, mas quer que a outra queira...
Mara...
Até a próxima.
Forte abraço.
Atenciosamente;
Emerson.
Valeu Niãna...
Me diverti bastante!!!
ResponderExcluir...Como sempre digo, sua escrita é massa!
Curti!
Salve Lispector. :)
Lai
Woopa!
ExcluirObrigadão Alah, gracias!
Valeu mesmo, estamos sempre gratos pela sua leitura e pelos elogios e incentivos.
Salve a Clarice sim...
Abraço;
Emerson...