Senhoras. Senhores...
Bom dia/tarde/noite; a depender do momento
que estejas lendo.
Esperamos que gostem da encomenda desta data
que se segue...
Hoje é dia de trazer aqui a capa que inspirou
a série “Capas Inspiradoras” destas postagens do blog.
Hoje, este humilde espaço tem a honra, e o
orgulho, de trazer à luz a capa do melhor cd de Rap, em nossa opinião; um dos
primeiros discos duplos deste segmento artístico; Direto do Campo de
Extermínio, do grupo Facção Central.
As produções, de sentido; possibilidades de
leitura são tantas quando observamos essa capa que, hoje, estrategicamente,
resolvemos nos limitar a alguns mini-comentários sobre esta obra-prima do Rap.
Sem muita conversa; vamos logo...
Ao que interessa...
Aos sentidos...
A principal idéia do título nos faz atingir
concepções filosóficas. Convenhamos: uma pomba branca, morta, decaída, no chão,
suja de sangue, pode significar muita coisa.
A gravidade do texto imagético não se pode
passar em branco às nuvens. A pomba branca é um tradicional símbolo carregado,
em diversas crenças, do sentido de paz.
Na esfera religiosa, simboliza o espírito
santo. Na santíssima trindade, traz o sentido de paz, simplicidade,
pureza, harmonia, esperança e felicidade.
É advertido, em escrituras sagradas:
pode-se xingar, e haverás perdão, a Deus; mas não se pode xingar o espírito
santo. Vejam...
Um marco de esperança para a humanidade: Noé
lançou ao céu; e esperou o retorno de uma pomba, para saber se o dilúvio havia
sido vencido.
Ela voltou, com um ramo de oliveira no
bico; e assim a boa mensagem havia sido trazida: a Terra estava pronta
para ser, e foi, repovoada.
No âmbito antropológico, a idéia da morte
simbólica da paz está mais que clara, só ao visualizar a imagem, mais do que
expressiva.
Mas, algo que precisa ser apontado é que há
sinais flagrantes de que esse pensamento; essa visão já vinha sendo trabalhada
no disco anterior; em “A Marcha Fúnebre Prossegue.”. Sim; observe conosco.
Há uma música – O Show Começa Agora – na
qual é categórica e explicitamente cantado que “sua pomba branca está sangrando
num barraco”.
Sem mencionar a vinheta de fechamento do
mesmo álbum; onde é dito que “a paz tá morta; desfigurada no IML, sangue no
chão, revolver na mão, infelizmente a marcha aqui prossegue.”.
Flagramos em outra oportunidade; em um trecho
de outra canção – Discurso ou Revolver – algumas falas
interessantes; do tipo: “ser exterminado como judeus em Auschwitz; mostrar pra
Globo o que é viver no limite. A cruz da Atlanta queimando na sua frente; a SS
agora veste o cinza da PM”. Sintomático, não?
Ou, também muito explícito: “te dão crack;
fuzil; cachaça no boteco; esse é o campo de concentração moderno. Hitler; FHC,
capitão do mato, bacharéis em carnificina; mestrado em holocausto”.
Acreditamos que, diante do exposto não é
preciso provar mais nada. Está mais do que claro que a ideia foi amadurecendo,
amadurecendo; até que se concluiu; e desaguou num disco duplo perfeito; sólido;
super comunicativo, desde sua capa, e que se estende por suas vinhetas.
Entrando na questão do imagem mesmo da capa
do disco, outro pensamento que nos foi despertado foi o de que a pomba caída é
o símbolo da extrapolação da violência. Será que é por isso que temos uma faixa
que diz que “deus anda de blindado, cercado protegido por dez anjos armados” e,
pasmem, sobre a pomba branca: “tem dois tiros no peito”?
Será?
Eu acredito que sim...
Há, também, neste disco, a possibilidade de
leitura de que a periferia é, além de uma detenção sem muro, como foi
anteriormente pensado; um campo de concentração, e, ainda mais grave, o titulo
já diz, de extermínio. Não à toa a música abre alas chamar-se São
Paulo: Auschwitz Versão Brasileira.
Segundo dizem, Eduardo operou em alta, e
pessoalmente, na criação da capa deste disco, enfrentando, inclusive,
contraposições dentro do próprio grupo.
Seguiu firme em sua idéia, e deu no que deu.
Afinal, quando planejamento e coerência caminham de mãos dadas, não há o que
temer em termos de resultados finais de nossas tarefas.
Nada; nada foi em vão. Nada; nada foi
feito/escolhido sem planejamento e ou critério para este trabalho.
Nada!
E, pasmem, olha que acidente conveniente: foi
descoberto por nós que a pomba branca é usada também como sacrifício por judeus
pobres. Portanto, abrir o disco com a imagem de uma pomba, pode nos direcionar
a idéia de que a fotografia daquela pomba é a prática de um sacrifício feito
por um periférico que trazer vários depoimentos.
É o preço a se pagar por poder ter escrito
algo tão grandioso.
Será que era sabido o que estava sendo feito?
Será? Em O Homem Estragou Tudo há a afirmação de que “Depois
da senzala a tortura é na favela. Hitler morreu, mas tô no gueto, judeu da nova
era”. Que acidente incrível hein?
Hum...
Demarcada – e muito bem demarcada – a área de
atuação, é hora de ir ao interior do disco; onde as vozes dos habitantes dos
campos de concentração e extermínio espalhados pelo Brasil dialogam; se
apresentam, e representam; como personagens principais deste cenário de
ambiente hostil.
Daí ao uníssono polifônico: temos as
presenças de um garoto, filho de pai alcoólatra; um menor, constantemente
agredido pela mãe; o espectador da violência, sentado no balcão do bar da
favela; um dependente químico (crack); um pai explorado pela família; dois
garotos, presos, um em extrema riqueza, outro em extrema pobreza, polarizados
socialmente; e assim por diante.
Todas as vozes, sendo vozes únicas; cada uma
com seu conflito particular, mas, todas elas, sofrendo com o autoritarismo
estatal brasileiro, todos habitantes do campo de extermínio moderno; tal como
foram os judeus na época da Alemanha Nazista.
Daí a idéia de o ambiente ser polifônico,
composto por vozes únicas; e uníssono, composto por vozes que sofrem
simultaneamente no mesmo lugar, vítimas da mesma violência, social, cultural,
simbólica, física e psicológica do estado; ainda que existam notáveis diferenças
entre si.
Eu não vou recomendar, tenho certeza de que
não preciso.
Quem leu até aqui, percebeu: somos fãs
incondicionais, quase-que fundadores do FCFC (Facção Central Futebol Clube).
E este foi o texto feito para a capa que me
motivou a criar a série “capas Inspiradoras”.
Esta é a minha mais deslavada menção honrosa
à capa da mais bela obra-prima do rap; em minha opinião, sempre bom repetir.
Viva ao “Direto do Campo de Extermínio”, o
disco belo até, e aqui nós nos repetimos, em suas vinhetas; O que os
olhos vêem; e Reflexões no corredor da morte. “Aqui
não tem lista de Schindler com seu nome! Não existe salvação; no campo de
extermínio...”.
Hoje, o grupo está muito a quem do que já
foi; bem sabemos.
Contudo, o que foi gerado em memória, bem sabemos
nós que deve ser muito; muito; muito; muitíssimo respeitado, por qualquer que
seja o sujeito que curta a batida da quebrada, ainda que não curta FC.
Enfim, quando tiverem vontade de falar acerca
de Facção Central, podem nos convidar; que nos sentiremos honrados; e iremos
gentilmente ao seu encontro.
Esteja você onde estiver, iremos até você
para prosearmos à vontade, sem medo, e sem preconceito sobre esse grupo, único,
não na música brasileira; no mundo.
O negócio é ter um bom papo, refletir.
Ah: faz um café, por favor...
Nós vamos adorar...
Grande abraço;
Fiquem na mais pura e plena paz;
Segue a capa-imagem da obra máxima do mundo-Rap...
Atenciosamente;
Emerson.